terça-feira, 28 de junho de 2011

eU fOtÓgRaFa


Poderia escolher uma foto do meu acervo pessoal que envolvesse mais requinte para ser analisada, mas não me sentiria confortável, pois quanto mais técnica presente, mais desconfortável me sinto. Talvez porque a técnica ainda não seja algo tão sincero e orgânico nas minhas críticas e nos meus atos de fotografar, na rotina dessa minha paixão, ou talvez, porque ao fotografar a todo instante a vida e seus arredores com as retinas dos meus olhos, eu não precise dela, da técnica, e sim da sensibilidade do meu olhar que dá sentidos surpreendentes a minha vida, evidenciando planos mágicos e memórias e desejos vívidos de cada clicada ou se preferirem, piscada.

Sou uma fotógrafa adepta das imagens sensíveis e não das imagens cercadas de formas, sobrecarregada de técnicas e correções. Não que eu abomine a técnica e não a julgue importante, muito pelo contrário, ela me faz falta quando o assunto é fotografar enquanto trabalho encomendado e não de forma espontânea e pessoal. Considero sim, importante a técnica e admiro trabalhos de grande fotógrafos de técnicas ímpares, como é o caso do admirável Eugenio Recuenco. Mas o que quero destacar aqui são minhas posições e apreço pela fotografia que traz consigo histórias e sentidos humanos, imagens que nos dizem muito mais do que podemos imaginar.

Essa fotografia aqui exposta antes do texto, por exemplo, se eu não dissesse, você acreditaria que ela foi tirada em pleno carnaval, que nesse instante, atrás de mim, estava passando o Bloco Vai Tomar Banho, com um caminhão pipa lançando água nos foliões? E é aí que está a magia dessa foto. O destaque para mim, não foi as minhas clicadas que retratou os foliões encharcados e felizes e sim o registro de uma vida cotidiana, de uma senhora que assim como as namoradeiras mineiras, em algum momento do seu dia, chega até a janela, nem que seja para verificar se vai chover, e isso, ninguém repara, pois infelizmente, para a maioria, o importante é o bloco que está passando. E por falar em janelas, as janelas são os caminhos iniciais de uma fotografia. E na janela seletiva da câmera que a luz entra para fotografar o que o olhar seletivo do fotógrafo sentiu motivado a enquadrar na janela da câmera a aprtir da janela do seu olhar. É através desse princípio que fotógrafo e a imagem seletiva se intercedem na ação fotográfica.

Muitas vezes, as fotografias com as quais nos deparamos em exposições de arte, apesar de belas e do conjunto de técnicas arrojadas, elas não nos tocam, não são capazes de abrir as gavetas das nossas memórias e infiltrar em nosso plano sensível. Para mim, o melhor tipo de fotografia é aquela que nos cerca, que não nos cansamos de ver e rever. É aquela que trabalha com o imaginário, que tem expressões que nos permite emitir bons conceitos sobre ela.

Fotografia boa é aquela que é como texto, onde olhamos e vamos lendo. É aquela que é o depoimento da realidade e que potencializa essa leitura através de uma imagem ou retrato de uma pessoa, nos permitindo um pensamento amplo e estendido.

Ao fotografar alguém ou algo, um passa pelo outro, o fotógrafo e a pessoa ou imagem fotografada e para mim, a única preocupação quando o meu “Eu Fotógrafa” está em ação, é com a relação de uma troca sensível com a janela seletiva a ser fotografada. Ao clicar, fotografar, meu intuito é mostrar um pedacinho do outro ou de um lugar e não um simples personagem que posa e um ponto rotineiro despercebido. Fotografias são testemunhas de momentos únicos das belezas cotidianas da vida.

Sinto já ter induzido demais os olhares de outrem nessa fotografia aqui apresentada. Uma vez que a obra morre a partir do momento que o artista a expõe as releituras dos expectadores, que às vezes são bem diferentes das provenientes do processo de criação, deixo aqui o retrato dessa linda senhora que talvez não tenha nem ciência dessa fotografia. Que está possa abalar de alguma forma seus expectadores, exprimindo sensações, gerando reflexões, enfim, tocando o seu campo sensível e faça valer pelo menos um pouco o meu conceito de fotografia.

Notas:
A foto foi tirada na cidade de Rio Doce - MG, durante o meu trabalho no Carnaval 2011 (Sambar com a Gente do Rio é Doce)
Texto escrito para o trabalho da disciplina "História da Fotografia" - UFJF (Prof. Afonso Celso). Foi pedido para que analisássemos uma fotografia pessoal.

Um comentário:

  1. Você nos presenteia com sua sensibilidade e registros únicos de uma forma particular e sutil de ver e viver a vida tão bela o quanto ela é!
    Suas histórias apresentadas através dos textos ou fotografias me fazem ultrapassar os limites da imaginação, e muitas vezes transpor o imaginável. É muito gratificante ter acesso ao seu rico acervo de fotografias e idéias, "muitas vezes sem técnicas", será? RS, mas sem sombra de dúvidas, com muita sensibilidade, dedicação e amor pelo que faz!
    Parabéns pelo texto maravilhoso!

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